Charge de autoria de Thiago Lucas, via Folha de Pernambuco
Contanto: fabioasl@gmail.com
O Economista britânico Arthur Lewis,
ganhador do Oscar de Economia em 1979, defendia que a educação nunca seria uma
despesa para o Estado. Na verdade, segundo ele, “era um investimento com
retorno garantido”. No entanto, ao contrario dessa afirmação, parece que o
Brasil corre à direção contrária. Isso porque, em 2015, ano em que o governo
brasileiro adotou o slogan do segundo mandato “Pátria Educadora”, foi um
desastre para o setor da Educação. Na verdade, na contramão da propaganda
oficial, o setor da educação, por meio do Ministério da Educação, o MEC, perdeu
10,5 bilhões de reais, o que equivale a 10% do
orçamento previsto para a área.
Desse modo, de todos os programas educacionais, os
que mais sofreram cortes foram o Pronatec e o Fies, com atraso de pagamentos de
bolsas, fechamento de turmas, imposição de restrições e alterações no
financiamento estudantil. Além disso, a escassez de recursos atingiu programas
como o “Mais Educação” e o “Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa”. Somado a isso, ainda tivemos o corte de
verbas das Universidades Federais, o que resultou em grandes e longas greves
por diversas partes do país, prejudicando toda a comunidade escolar.
Diante desse contexto difícil, de falta de
recursos, investimentos e corte de orçamento, o que esperar da educação
nacional em 2016? Como atingir, por exemplo, as metas do Plano Nacional de
Educação aprovado em 2014, dentre elas, a de se investir 10% do PIB em
Educação?
A resposta evidente para essa crise na
Educação, do ponto de vista do governo, seria o da falta de recursos
financeiros, visto o grave cenário de crise econômica por qual o país passa,
com aumento na queda de arrecadação de impostos, em todos os níveis
federativos, além do cenário econômico internacional negativo, o que
impossibilita maiores investimentos em educação e até mesmo o possível corte de
mais recursos, com previsão de redução do Orçamento da pasta.
Por outro lado, penso que se aprofundarmos
mais essa analise, perceberemos que o maior problema não foi econômico, mas
sim, de planejamento e de estratégia. Quem não se lembra da descoberta do
pré-sal, em 2006, quando o Ministro da Educação da época, Aluízio Mercadante,
anunciou que 75% dos royalties do petróleo seriam destinados para educação e
25% para saúde. Além disso, previa-se que 50% de todos os recursos do Fundo
Social do pré-sal seriam destinados às duas pastas. Inclusive, a lei foi
sancionada sem vetos pela presidente Dilma Roussef no ano passado.
No entanto, o que foi comemorado na época como
a grande joia do desenvolvimento nacional parece não ter vingado. Há algumas
razões para isso: Primeiro porque o preço petróleo está muito abaixo do que já
foi no passado. O governo acreditava que o preço futuro se manteria aos níveis
mais altos, o que não se concretizou. Tanto que o preço do barril hoje é um dos
mais baixos da história, cotado a U$ 22,48.
A segunda razão para isso é que além de ser
um recurso finito, o petróleo é um dos maiores poluidores do planeta, e por
isso vem sendo gradativamente substituído por fontes alternativas de energia,
até mesmo pela China, uma das maiores consumidoras desse combustível do mundo, que
vem reduzindo seu consumo.
Em terceiro, a estatal brasileira
responsável pela exploração e comercialização, a Petrobrás, encontra-se diante
de uma grave crise de confiança e credibilidade, a partir do inicio Operação
Lava-Jato, da Policia Federal, que vem investigando e trazendo inúmeras denuncias
de corrupção e esquemas de favorecimento e enriquecimento ilícitos de grupos políticos
e alguns funcionários que tomaram de assalto à empresa, o que vem afetando
negativamente sua imagem perante o mercado mundial.
Se não bastasse tudo isso, a realidade cada
vez mais atenuante do aquecimento global se impõe sobre a continuidade da
exploração e comercialização de combustíveis fosseis, poluidores do planeta,
como o petróleo. Tanto que a Cúpula do Clima – COP 21, realizada em dezembro do
ano passado em Paris, estabeleceu um acordo inédito entre todos os países
participantes sobre a necessidade de redução das emissões dos gases do efeito
estufa. Na verdade, o acordo
determina que seus 195 países signatários ajam para que a temperatura média do
planeta sofra uma elevação "muito abaixo de 2°C", mas "reunindo
esforços para limitar o aumento de temperatura a 1,5°C".
Nesse cenário, se não pudermos contar com
os recursos da exploração do pré-sal, o que fazer então para aumentar os
investimentos em educação? Como o estado brasileiro poderá cumprir com todas as
metas do PNE até 2024? Como, de praxe, no Brasil, de tempos em tempos,
principalmente em períodos de crise, surgem propostas de diminuição da
participação do estado nos investimentos públicos em educação.
Uma delas, proposta pelo deputado federal
Marcelo Crivella (PRB–RJ) estipula que estudantes com melhores condições
financeiras devam pagar mensalidades nas Universidades Públicas. Dentre os
argumentos a favor, está o fato de que só os ricos que pagariam pelos estudos
universitários e instituições públicas, o que por sua vez poderia bancar bolsas
de estudos para estudantes pobres. Além disso, argumenta-se que o estado
brasileiro não tem condições bancar todas as etapas de ensino.
Porém, os argumentos contra essa tese são
vários e consistentes. Dentre eles, e o principal, está no fato de que a
Universidade é pública, portanto, ela deve ser gratuita para todos, simples
assim. Esse direito é garantido pela nossa Constituição, no artigo 206, que
determina “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais.”.
A partir desse contexto, constatamos que o
problema é bem mais amplo e complexo. Não há garantias de que a cobrança no
Ensino Superior Público resolva o problema da falta de verbas das instituições
universitárias. Pelo contrário, medidas como essas podem gerar mais problemas, acelerando,
na pior das hipóteses, o processo de desvalorização e sucateamento das
Universidades Públicas.
Desse modo, o mais interessante é que os
ricos pagassem mais impostos, em vez de mensalidades em Universidades públicas.
E há boas razões para isso, vejamos por que. O
economista Thomas Piketty, que ganhou enorme notoriedade em 2013, com a
publicação do livro O capital no século
XXI, realizou um grande estudo para compreender a evolução histórica da desigualdade no mundo e as suas relações com as decisões
do Estado, como aquelas sobre tributação, sobre investimentos, etc.
Nesse sentido, o autor defende que a repartição de
riquezas é um problema político fundamental para a estabilidade das nações
democráticas modernas. Isso porque há em curso uma enorme concentração de renda
no mundo, gerando cada vez mais desigualdades, pobreza e miséria no planeta.
Para reforçar essa tese, foi divulgado recentemente
um relatório, as vésperas do Fórum Econômico Mundial de Davos, mostrando que a
riqueza acumulada por 1% da população ultrapassa a dos outros 99% no mundo.
Sendo assim, essa enorme concentração de renda tem dificultado cada vez mais a
luta contra as desigualdades.
No Brasil não é diferente. Os estudos de Piketty revelaram
que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo. Os mais ricos, uma
minoria, concentram mais de 66% das riquezas do país. Essa grande concentração
de renda observada hoje foi mantida durante o último século, apesar de
observarmos algumas variações associadas a decisões políticas de inclusão, de
distribuição de renda, como a bolsa família, por exemplo.
Apesar de ser um tema polemico, é fundamental e
urgente a discussão sobre a distribuição de riquezas e a taxação de riquezas no
país, por meio da cobrança de impostos sobre fortunas, que poderão contribuir
para processos de desconcentração de renda e serem revertidos para o
investimento em educação.
Isso demonstra como a educação e a concentração de
renda se relacionam e se retroalimentam. Segundo o Professor da USP, Otaviano
Helene, “quanto maior a renda familiar de
uma criança ou um jovem, maior é o número de anos de estudo que terá e melhor a
educação que receberá; de outro lado, quanto melhor a escolarização, maior será
sua renda futura. A combinação desses dois efeitos forma um circulo vicioso que
contribui para perenizar a atual desigualdade de renda no país”.
Ainda segundo Helene “O sistema educacional reproduz as desigualdades atuais e projeta-as
para o futuro. Filhos de pobres serão pouco e mal escolarizados, ocuparão
funções mal renumeradas e terão filhos mal escolarizados; filhos de ricos serão
bem escolarizados, terão rendas mais altas e filhos melhor escolarizados”.
Portanto,
o principal instrumento para superação de desigualdades no Brasil é o maior investimento
em educação. Lewis já nos deu a lição de casa: Educação não é gasto, é
investimento. De fato, o governo deve investir em todos os níveis de educação,
desde a básica até o Ensino Superior, oferecendo uma educação pública e de
qualidade. Enfim, como bem disse o grande Paulo Freire, se a educação sozinha
não muda a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda.