segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Lição de casa: Educação não é gasto, é investimento.

Charge de autoria de Thiago Lucas, via Folha de Pernambuco

Contanto: fabioasl@gmail.com

O Economista britânico Arthur Lewis, ganhador do Oscar de Economia em 1979, defendia que a educação nunca seria uma despesa para o Estado. Na verdade, segundo ele, “era um investimento com retorno garantido”. No entanto, ao contrario dessa afirmação, parece que o Brasil corre à direção contrária. Isso porque, em 2015, ano em que o governo brasileiro adotou o slogan do segundo mandato “Pátria Educadora”, foi um desastre para o setor da Educação. Na verdade, na contramão da propaganda oficial, o setor da educação, por meio do Ministério da Educação, o MEC, perdeu 10,5 bilhões de reais, o que equivale a 10% do orçamento previsto para a área.
Desse modo, de todos os programas educacionais, os que mais sofreram cortes foram o Pronatec e o Fies, com atraso de pagamentos de bolsas, fechamento de turmas, imposição de restrições e alterações no financiamento estudantil. Além disso, a escassez de recursos atingiu programas como o “Mais Educação” e o “Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa”. Somado a isso, ainda tivemos o corte de verbas das Universidades Federais, o que resultou em grandes e longas greves por diversas partes do país, prejudicando toda a comunidade escolar.
Diante desse contexto difícil, de falta de recursos, investimentos e corte de orçamento, o que esperar da educação nacional em 2016? Como atingir, por exemplo, as metas do Plano Nacional de Educação aprovado em 2014, dentre elas, a de se investir 10% do PIB em Educação?
A resposta evidente para essa crise na Educação, do ponto de vista do governo, seria o da falta de recursos financeiros, visto o grave cenário de crise econômica por qual o país passa, com aumento na queda de arrecadação de impostos, em todos os níveis federativos, além do cenário econômico internacional negativo, o que impossibilita maiores investimentos em educação e até mesmo o possível corte de mais recursos, com previsão de redução do Orçamento da pasta.
Por outro lado, penso que se aprofundarmos mais essa analise, perceberemos que o maior problema não foi econômico, mas sim, de planejamento e de estratégia. Quem não se lembra da descoberta do pré-sal, em 2006, quando o Ministro da Educação da época, Aluízio Mercadante, anunciou que 75% dos royalties do petróleo seriam destinados para educação e 25% para saúde. Além disso, previa-se que 50% de todos os recursos do Fundo Social do pré-sal seriam destinados às duas pastas. Inclusive, a lei foi sancionada sem vetos pela presidente Dilma Roussef no ano passado.
No entanto, o que foi comemorado na época como a grande joia do desenvolvimento nacional parece não ter vingado. Há algumas razões para isso: Primeiro porque o preço petróleo está muito abaixo do que já foi no passado. O governo acreditava que o preço futuro se manteria aos níveis mais altos, o que não se concretizou. Tanto que o preço do barril hoje é um dos mais baixos da história, cotado a U$ 22,48.
A segunda razão para isso é que além de ser um recurso finito, o petróleo é um dos maiores poluidores do planeta, e por isso vem sendo gradativamente substituído por fontes alternativas de energia, até mesmo pela China, uma das maiores consumidoras desse combustível do mundo, que vem reduzindo seu consumo.
Em terceiro, a estatal brasileira responsável pela exploração e comercialização, a Petrobrás, encontra-se diante de uma grave crise de confiança e credibilidade, a partir do inicio Operação Lava-Jato, da Policia Federal, que vem investigando e trazendo inúmeras denuncias de corrupção e esquemas de favorecimento e enriquecimento ilícitos de grupos políticos e alguns funcionários que tomaram de assalto à empresa, o que vem afetando negativamente sua imagem perante o mercado mundial.
Se não bastasse tudo isso, a realidade cada vez mais atenuante do aquecimento global se impõe sobre a continuidade da exploração e comercialização de combustíveis fosseis, poluidores do planeta, como o petróleo. Tanto que a Cúpula do Clima – COP 21, realizada em dezembro do ano passado em Paris, estabeleceu um acordo inédito entre todos os países participantes sobre a necessidade de redução das emissões dos gases do efeito estufa. Na verdade, o acordo determina que seus 195 países signatários ajam para que a temperatura média do planeta sofra uma elevação "muito abaixo de 2°C", mas "reunindo esforços para limitar o aumento de temperatura a 1,5°C".
Nesse cenário, se não pudermos contar com os recursos da exploração do pré-sal, o que fazer então para aumentar os investimentos em educação? Como o estado brasileiro poderá cumprir com todas as metas do PNE até 2024? Como, de praxe, no Brasil, de tempos em tempos, principalmente em períodos de crise, surgem propostas de diminuição da participação do estado nos investimentos públicos em educação.
Uma delas, proposta pelo deputado federal Marcelo Crivella (PRB–RJ) estipula que estudantes com melhores condições financeiras devam pagar mensalidades nas Universidades Públicas. Dentre os argumentos a favor, está o fato de que só os ricos que pagariam pelos estudos universitários e instituições públicas, o que por sua vez poderia bancar bolsas de estudos para estudantes pobres. Além disso, argumenta-se que o estado brasileiro não tem condições bancar todas as etapas de ensino.
Porém, os argumentos contra essa tese são vários e consistentes. Dentre eles, e o principal, está no fato de que a Universidade é pública, portanto, ela deve ser gratuita para todos, simples assim. Esse direito é garantido pela nossa Constituição, no artigo 206, que determina “gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais.”.
A partir desse contexto, constatamos que o problema é bem mais amplo e complexo. Não há garantias de que a cobrança no Ensino Superior Público resolva o problema da falta de verbas das instituições universitárias. Pelo contrário, medidas como essas podem gerar mais problemas, acelerando, na pior das hipóteses, o processo de desvalorização e sucateamento das Universidades Públicas.
Desse modo, o mais interessante é que os ricos pagassem mais impostos, em vez de mensalidades em Universidades públicas. E há boas razões para isso, vejamos por que. O economista Thomas Piketty, que ganhou enorme notoriedade em 2013, com a publicação do livro O capital no século XXI, realizou um grande estudo para compreender a evolução histórica da desigualdade no mundo e as suas relações com as decisões do Estado, como aquelas sobre tributação, sobre investimentos, etc.
Nesse sentido, o autor defende que a repartição de riquezas é um problema político fundamental para a estabilidade das nações democráticas modernas. Isso porque há em curso uma enorme concentração de renda no mundo, gerando cada vez mais desigualdades, pobreza e miséria no planeta.
Para reforçar essa tese, foi divulgado recentemente um relatório, as vésperas do Fórum Econômico Mundial de Davos, mostrando que a riqueza acumulada por 1% da população ultrapassa a dos outros 99% no mundo. Sendo assim, essa enorme concentração de renda tem dificultado cada vez mais a luta contra as desigualdades.
No Brasil não é diferente. Os estudos de Piketty revelaram que o Brasil é um dos países mais desiguais do mundo. Os mais ricos, uma minoria, concentram mais de 66% das riquezas do país. Essa grande concentração de renda observada hoje foi mantida durante o último século, apesar de observarmos algumas variações associadas a decisões políticas de inclusão, de distribuição de renda, como a bolsa família, por exemplo.
Apesar de ser um tema polemico, é fundamental e urgente a discussão sobre a distribuição de riquezas e a taxação de riquezas no país, por meio da cobrança de impostos sobre fortunas, que poderão contribuir para processos de desconcentração de renda e serem revertidos para o investimento em educação.
Isso demonstra como a educação e a concentração de renda se relacionam e se retroalimentam. Segundo o Professor da USP, Otaviano Helene, “quanto maior a renda familiar de uma criança ou um jovem, maior é o número de anos de estudo que terá e melhor a educação que receberá; de outro lado, quanto melhor a escolarização, maior será sua renda futura. A combinação desses dois efeitos forma um circulo vicioso que contribui para perenizar a atual desigualdade de renda no país”.

Ainda segundo Helene “O sistema educacional reproduz as desigualdades atuais e projeta-as para o futuro. Filhos de pobres serão pouco e mal escolarizados, ocuparão funções mal renumeradas e terão filhos mal escolarizados; filhos de ricos serão bem escolarizados, terão rendas mais altas e filhos melhor escolarizados”.

            Portanto, o principal instrumento para superação de desigualdades no Brasil é o maior investimento em educação. Lewis já nos deu a lição de casa: Educação não é gasto, é investimento. De fato, o governo deve investir em todos os níveis de educação, desde a básica até o Ensino Superior, oferecendo uma educação pública e de qualidade. Enfim, como bem disse o grande Paulo Freire, se a educação sozinha não muda a sociedade, sem ela tão pouco a sociedade muda.