sábado, 29 de julho de 2017

“Pátria Educadora” e os objetos perdidos



Fabio Augusto da Silva Lima
Contato: fabioasl@gmail.com


O Brasil realmente é um país surpreendente. Em janeiro de 2015, o governo de Dilma Roussef tomava posse para o seu segundo mandato com slogan “Brasil: pátria educadora”. Dois anos e meio depois, depois do processo de impeachment que afastou a presidente e que colocou em seu lugar Michel Temer, analisando a atual situação da educação brasileira, esse slogan chega a soar como uma ofensa.

E há bons motivos para esse descontentamento. Várias iniciativas trazem preocupação, como a promulgação da lei do teto dos gastos públicos, que tem como objetivo reduzir o investimento público federal, bem como a aprovação da reforma trabalhista, que flexibiliza as leis de trabalho e possibilita a terceirização do trabalho, inclusive permitindo a terceirização das atividades fim da administração pública, como no caso dos professores públicos.

O sistema educacional brasileiro por sua vez, também tem sofrido com a redução de orçamento e investimentos. Vários programas sofreram com essas medidas de austeridade, como o FIES, o Enem, o Pronatec e o Ciência sem fronteiras dentre outros.

Com a contenção de gastos pelo governo federal, corre-se o risco inclusive de não haver reajuste do piso salarial dos professores da educação básica em 2018. Sem contar que a maioria dos municípios e estados brasileiros já não pagam o atual piso salarial estabelecido, no valor de R$ 2.298,80.

Isso tudo em meio a um discurso de responsabilização do funcionalismo público pelo rombo das contas públicas. Nesse sentido, já se constrói a narrativa da necessidade de reformas, como a da previdência, que pretende fazer com que os professores tenham que trabalhar mais e se aposentar mais tarde.

Recentemente, a capa do jornal Folha de São Paulo estampou que a “Ausência de professor da rede pública chega a 30 dias no ano no Estado de São Paulo”. Na reportagem, expõe que “o absenteísmo dos professores representa dificuldades de redes e escolas em garantir o essencial para a educação: ter o professor na sala de aula.”.

No entanto, a matéria quase não explora as razões pelo qual esse professor se ausenta do trabalho. Não falam das péssimas condições de trabalho oferecidas, dos baixos salários, da violência no qual muitos estão expostos, as doenças e enfermidades causadas pelo estresse do cotidiano da profissão, dentre outros problemas.

Se não bastasse isso, o jornal expõe essa matéria dentro de uma perspectiva economicista, pois avalia que “esse volume de ausências é um problema concreto da educação” e continua “tanto para o resultado da educação, quanto à eficiência do gasto público’. Como resposta, o governo de Geraldo Alckmin diz que “as ausências reduzem a possibilidade de ganho de bônus salarial”. Vejam o absurdo, dentro dessa lógica, a educação é vista como gasto, meritocracia e não como investimento.

Como compensação, no final da matéria, reconhece que a maioria dos professores tem sobrecarga de trabalho e que muitos sofrem da síndrome de burnout, que a literatura médica descreve como síndrome do esgotamento profissional. No entanto, não aponta nenhuma solução para esse grave problema. Professores vítimas ou vilões? Manipulação de opinião?

Nesse contexto, fica claro que a educação não é prioridade no Brasil. De fato, com tudo o que foi exposto, fica claro que na verdade há um retrocesso em termos de educação. E isso vai na contramão do que acontece no mundo, pois os países que apresentam os melhores índices de desenvolvimento humano tem a educação como prioridade.

No entanto, ainda não aprendemos que uma das condições responsáveis pelo nosso baixo padrão escolar é a falta de recursos públicos. E para superarmos esse atraso é preciso investimento. E não é preciso nenhuma pirotecnia, já temos um Plano Nacional de Educação, que estabelece metas e objetivos a serem alcançados e que coloca a necessidade de um maior investimento com a educação, estimado em pelo menos 10% do PIB nacional. Basta interesse e vontade para colocá-lo em prática. 

Mas o que esperar de um governo corrupto e ilegítimo, que conseguiu colocar o país novamente no mapa da fome mundial? Como diz o grande escritor latino-americano, Eduardo Galeano, vivemos a época dos objetos perdidos. Ele diz assim:

O século XX, que nasceu anunciando paz e justiça, morreu banhado em sangue e deixou o mundo muito mais injusto que o que havia encontrado.

O século XXI, que também nasceu anunciando a paz e justiça, está seguindo os passos do século anterior.

Lá na minha infância, eu estava convencido de que tudo o que na terra se perdia ia parar na lua.

No entanto, os astronautas não encontraram sinhôs perigosos, nem promessas traídas, nem esperanças rotas.

Se não estão na lua, onde estão?

Será que na terra não se perderam?

Será que na terra se esconderam?

Portanto, o governo que nasceu anunciando a “pátria educadora”, está deixando como legado os passos do século anterior, ou seja, que não nos deixa avançar e progredir e que só nos faz retroceder a uma época dos “objetos perdidos”.

Referencias

GALEANO, Eduardo. Espelhos: uma história quase universal. São Paulo, L&PM Editores, 2008.