sábado, 28 de maio de 2016

Doutrinação Ideológica?


Cléder Aparecido Santa-Fé
E-mail: casantafe83@gmail.com

Nas últimas semanas, ocorreu uma certa polêmica devido a tramitação, no poder legislativo, do Projeto de Lei nº 867/2015, que tem por objetivo punir a prática de doutrinação ideológica nas escolas brasileiras, proposta encaminhada pela organização "Escola Sem Partidos".

Os principais pontos abordados no projeto de lei são: a neutralidade política, ideológica e religiosa do Estado; o pluralismo de ideias no ambiente acadêmico; a liberdade de aprender, como projeção específica, no campo da educação, da liberdade de consciência; a liberdade de crença; o reconhecimento da vulnerabilidade do educando como parte mais fraca na relação de aprendizado; educação e informação do estudante quanto aos direitos compreendidos em sua liberdade de consciência e de crença; direito dos pais a que seus filhos recebam a educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções e, por fim, proibir, em sala de aula, a prática de doutrinação política e ideológica bem como a veiculação de conteúdos ou a realização de atividades que possam estar em conflito com as convicções religiosas ou morais dos pais ou responsáveis pelos estudantes.

Os pontos grifados são os mais problemáticos nesta proposta tão complexa, uma vez que a ação do professor estará cerceada aos princípios éticos e morais dos pais do educando. Neste sentido, onde está a neutralidade política, ideológica e religiosa também exposta no projeto? Outra questão a ser pontuada é como o educando, como parte mais fraca na relação de aprendizado, irá diagnosticar práticas de doutrinação ideológica? Quais serão os critérios para avaliar tal prática?

É evidente que devemos defender uma imparcialidade dos conteúdos ministrados pelos professores, com a exposição de um tema de forma plural, cabendo ao docente que esteja, por exemplo, ministrando aula sobre o Capitalismo, apresentar os aspectos positivos deste sistema, como as conquistas das liberdades individuais e a consolidação das democracias modernas durante o século XX, utilizando-se de referências teóricos liberais e/ou neoliberais, como também abordar os aspectos negativos deste sistema econômico, aprofundando os conceitos de desigualdade e pobreza no sistema capitalista, através das categorias marxianas.

Outra questão equivocada do projeto de lei está na criminalização do professor como único agente promotor de doutrinação ideológica, deixando de lado a doutrinação promovida em livros didáticos e correlatos. Cabe salientar que o professor não possui autonomia plena para ministrar suas aulas, ele deve estar pautado em uma base curricular definida pelo governo federal e amparado também por diretrizes educacionais em âmbito local. 

O projeto de lei também combate, implicitamente, o caráter político da educação, conceito amplamente defendido por Paulo Freire e, outrossim, verifica-se que a "escola sem partidos" deixaria de debater com maior profundidade assuntos relacionados à cidadania, ao republicanismo e ao funcionamento da política.

Portanto, cabe enfatizar que a defesa de uma maior neutralidade nos diferentes conteúdos transmitidos pela escola pode ser significativa, principalmente no que tange à análise e adoção de certos livros didáticos, muitos desses explicitamente imparciais em determinados temas, devendo esses materiais passarem por uma avaliação mais rígida enquanto reprodutores de ideologias político-partidárias, tanto à esquerda, quanto à direita. 

Ressalta-se que esse artigo é de caráter introdutório, pois o tema é complexo e exige maior aprofundamento, sendo insuficiente tratar todas as implicações deste projeto na educação brasileira em um simples artigo. Qual é a sua opinião sobre a doutrinação ideológica no ambiente escolar?