quarta-feira, 15 de julho de 2015

E o que a História ensina?



Em 1989, após a queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria, com o estabelecimento do EUA como grande potência do século XX, ressurgiu a ideia do fim da história, a partir dos escritos do economista americano Francis Fukuyama.  Desse modo, segundo o autor, o capitalismo e a democracia teriam se consolidado e o Liberalismo, no ápice de sua hegemonia, vencido todas as ideologias.
Enfim, dentro dessa lógica, seriam o fim dos processos históricos anteriores, pois o mundo e a humanidade enfim teriam chegado ao equilíbrio e progresso proposto pelo filosofo Hegel ainda no século XVIII.
No entanto, Heráclito, filosofo da Grécia antiga e considerado o pai da História já considerava desde a Antiguidade que tudo o que existe está em constante mudança ou transformação. Portanto, após um pouco mais de duas décadas desses postulados liberais, ao analisarmos o contexto atual, vemos que eles perderam a validade ou não se sustentam mais. Isso porque a História, ao invés de acabar, continua sua trajetória e fluxo permanente num mundo em turbulência.
Temos muitos exemplos desse processo, como por exemplo, os conflitos políticos gerados pela Primavera árabe no Egito em 2011, pelos indignados da Espanha e os manifestantes de Wall Street nos EUA no mesmo ano, os protestos políticos no Brasil em 2013, dentre outros movimentos pelo mundo que questionam e criticam a atual ordem dominante e reivindicam novas demandas, políticas, sociais e econômicas, com mais direitos sociais e liberdades individuais.
No Brasil, os protestos de 2013 trouxeram à tona o descontentamento da maioria da população com o sistema político brasileiro estabelecido, já que não se sentem representados pelos governos, em todas as suas esferas, federal, estadual e municipal.
Ora, diante desses exemplos, fica evidente que a História não terminou, pelo contrário, só mostra, na verdade, que esse sistema se esgotou e não contempla o bem-estar e direito de todos a uma vida digna, já que é desigual e desumano, privilegiando o lucro dos bancos e das grandes corporações, e ainda se encontra em crises permanentes.
Além disso, todas as medidas tomadas na Europa, por exemplo, com o objetivo de superar a crise atual não surtem efeito, pelo contrário, as medidas de austeridade implementadas nos países da zona do euro, só aumentam as dificuldades da população mais pobre, com o corte de direitos e benefícios sociais, afim de se manter os pilares da política econômica europeia e sustentar os interesses da Troika, do Banco Europeu e do FMI. Nesse contexto, a Grécia é a vítima da vez dos interesses do capital financeiro.
Inclusive, o próprio Papa Francisco, que representa uma das instituições mais conservadoras e mantenedoras desse sistema, a Igreja Católica, fez duras críticas ao Capitalismo em sua visita recente a Bolívia, afirmando que ele é uma forma de ditadura sutil, que não se sustenta mais, propondo uma mudança radical de estrutura, tanto econômica quanto social, pois segundo ele o Capitalismo “impôs a lógica dos lucros a qualquer custo, sem pensar na exclusão social ou na destruição da natureza”.
Nesse sentido, contrariando as “previsões” liberais de Fukuyama, a partir do que foi exposto, fica claro que a História, não só não acabou como ela continua viva, em movimento e continua testemunha de todas as mudanças estruturais e de suas consequências ao longo dos tempos.
Mas como dizia o grande escritor latino-americano Eduardo Galeano, “até que os leões tenham seus próprios historiadores, as histórias de caçadas continuam glorificando o caçador”. Quer dizer, enquanto a História for contada do ponto de vista dominante, continuará prevalecendo a gloria dos vencedores, entendam-se dominadores e opressores, em detrimento dos dominados e oprimidos.
No entanto, não quero me limitar também a uma visão de história unicamente materialista, de uma perspectiva marxista de luta de classes, mas indo além, sabemos que a evolução das sociedades humanas é dinâmica e diversificada, de fato, não podemos nos limitar a um único olhar de História, mas considerar outros pontos de vista, como a cultura e evolução dos diferentes povos, por exemplo.
Por fim, considero que outra lição importante da História, e que está por trás dos processos históricos são as utopias. Em sua etimologia, segundo o dicionário Houaiss, utopia significaria o “lugar ou estado ideal, de completa felicidade e harmonia entre os indivíduos” Inclusive, o pensador inglês Thomas More (1478-1535) escreveu ainda na Idade Média a sua obra mais conhecida, intitulada Utopia. Nela, o autor propõe a existência de uma sociedade ideal, alternativa ao estado absolutista inglês, no qual ele vivia. Portanto, idealiza uma sociedade livre, tolerante, que respeite a diversidade e que viva em harmonia, sendo justa e democrática.
Desde então, são as utopias que movem e continuam movendo o ser humano na busca de sua essência. É fato, ela está na sua origem, na sua memória coletiva. Como bem disse, mais uma vez Eduardo Galeano, “A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela se afasta dois passos. Caminhos dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar. ”
            Portanto, a todos aqueles que acreditam na História e nas utopias, caminhemos, pois mais importante do que pensar no futuro e olhar para o passado. Mas não só olhar, mas, sobretudo, aprender com ele. Essa é a maior lição!!!

Referências:
BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. IN BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. São Paulo: Brasiliense, 1989.
GALEANO, Eduardo. O Livro dos Abraços. Porto Alegre: L&PM, 1995.
MORE, Thomas. Utopia. Tradução de Pietro Nasetti. São Paulo: Martin Claret, 2005.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

O Fortalecimento da Cidadania contra o Desmonte do Processo Democrático


Cléder Aparecido Santa-Fé
E-mail: casantafe83@gmail.com.br

            Após toda a repercussão contra a manobra antidemocrática aplicada por Eduardo Cunha na “aprovação” da redução da maioridade penal, torna-se oportuno tecer uma breve reflexão sobre o fortalecimento da cidadania e sua importância contra o desmonte do processo democrático.
            Alguns autores, da filosofia e da ciência política, são de suma importância para compreendermos a participação popular.  Alexis de Tocqueville, pensador político do século XIX, destaca o papel da sociedade civil no sistema democrático, destacando que uma democracia efetiva resulta do conhecimento da população sobre as questões públicas, ou seja, a ação política de um povo definirá a existência de um governo liberal ou tirânico.
            Para Gramsci, pensador marxista do século XX, é na arena da sociedade civil que as classes sociais buscam legitimar sua hegemonia, através da difusão ideológica exercida por igrejas, partidos políticos, sindicatos, a mídia, entre outros atores.  Portanto, o sistema democrático é a arena politica para que as classes subalternas possam lutar por conquistas sociais e, em longo prazo, pela superação do sistema capitalista.
            Maria Lourdes Manzini Covre, no livro “O que é cidadania?”, alerta sobre os entraves na efetivação da cidadania, uma vez que os detentores do poder procuram promover ações voltadas aos seus interesses, ainda que disfarçadas de interesse público. Este é o caso da manobra atrelada por Cunha que sobrepôs os interesses da bancada da bala aos interesses da sociedade brasileira.
Diante desses conceitos, a nossa ação cidadã é determinante para legitimar ou repudiar ações totalitárias em um regime democrático, visto que uma cidadania efetiva, para além do direito ao voto, deve ser fruto da reivindicação, da manifestação e da participação popular na “coisa pública”.

Obs: Gostaria de pedir desculpas por possíveis reducionismos teóricos, uma vez que a proposta deste artigo é trazer breves reflexões sobre o contexto político atual do nosso país.

REFERÊNCIAS:
MANZINI-COVRE, M. L. O que é cidadania. São Paulo: Brasiliense, 2001.
VIOLIN, T.C. A Sociedade Civil e o Estado Ampliado, por Antonio Gramsci, Revista Eletrônica do CEJUR, v. 1, n. 1, ago./dez. 2006. Disponível em: <http://ojs.c3sl.ufpr.br/ojs/index.php/cejur/article/view/14846/9966>. Acesso em 03-07-2015.
TOCQUEVILLE, Alex: “A democracia na América”. Belo Horizonte/São Paulo: Itatiaia/Universidade de São Paulo, 1987.