sábado, 19 de setembro de 2015

Brasil “Pátria Educadora”?


Fábio Augusto da Silva Lima
Contato: fabioasl@gmail.com

No primeiro semestre de 2015, início do 2º mandato da Presidente Dilma Roussef, o slogan adotado pelo novo governo foi “Brasil: Pátria Educadora”. A partir dessa bandeira, acreditava-se que o país, enfim, teria a educação como prioridade nacional.  Mas, no Brasil, o que ainda prevalece, em termos de políticas públicas, são as propagandas e o marketing, em oposição às iniciativas reais e concretas.
Isso porque, acreditava-se que a educação, de fato, seria o instrumento de transformação do país. No entanto, o que estamos vendo na prática, é bem diferente. São muitos fatos que vão na contramão desse slogan, a começar pelo documento que fundamentou a nossa “Pátria Educadora”. A primeira contradição é que ele foi elaborado pela Secretária de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República, comandado pelo ministro Mangabeira Unger, sem nenhuma participação do Ministério da Educação, que é quem deveria ter conduzido às discussões a respeito desse tema.
Se por um lado, o documento apresenta apontamentos importantes, como a questão dos eixos a serem alcançados pela educação nacional, como cooperação federativa, reorientação do currículo, qualificação de diretores e professores e aproveitamento de novas tecnologias, por outro lado, percebe-se claramente um ponto de vista reducionista e conservador de educação, com uma visão homogênea de país, desconsiderando sua diversidade cultural e desigualdades sociais. Fala-se muito pouco dos avanços na área da educação nos últimos anos, e ainda, em sua essência, resgata teorias pedagógicas ultrapassadas, de carência cultural, culpabilizando, por exemplo, os mais pobres pelos baixos índices educacionais do IDEB, dentre outros pontos polêmicos.
Outro elemento importante é que o documento, em nenhum momento, cita o Plano Nacional da Educação, aprovado em 2014 e que foi uma grande conquista dos movimentos sociais em defesa da educação pública, bem como de todos os agentes escolares envolvidos, desde alunos, professores e gestores, já que o PNE buscou reconhecer a diversidade socioeconômica, regional e cultural da população brasileira, respondendo aos desafios colocados pelo século XXI e aos problemas educacionais a serem enfrentados pelo país, estabelecendo 20 metas a serem alcançados pela educação brasileira nos próximos 10 anos.
Sobre isso, há muitos obstáculos a serem superados pela educação nacional, como a questão do currículo, da formação de professores, da falta de docentes para atuar nas disciplinas da Educação Básica, a questão do acesso e permanência na escola pública, o alto índice de evasão escolar, principalmente no Ensino Médio, a inclusão e diversidade, a qualidade do ensino, dentre outros aspectos.
Por exemplo, a questão do currículo é bastante polemica. No documento “Pátria Educadora” defende-se o estabelecimento de uma Base Nacional Comum para todo o território brasileiro. Mas a questão é, o que os alunos precisam aprender?  Quais capacidades e competências são necessárias para viver e atuar numa sociedade tecnológica como a nossa? Porque pensar em desenvolvimento de competências socioemocionais para determinados perfis de alunos em situação de risco, quando podemos pensar e propor um currículo para seu desenvolvimento integral?
Além disso, há que se considerar a enorme resistência de algumas redes, inclusive de uma parcela significativa de professores em adotarem novas posturas e metodologias de ensino. Exemplo disso foi os dados divulgados sobre os resultados da última edição do ENEM. Apesar de minoritárias, as melhores escolas públicas avaliadas pelo exame nacional são em sua maioria colégios federais, que oferecem cursos técnicos e realizam seleção de alunos. No mais, contam com uma grade curricular extremamente tradicional e conservadora, pautados pelos exames, eficiência e meritocracia.
No que se refere à formação de professores, há um grande abismo entre o que se ensina nos cursos de formação em licenciatura das Universidades e Faculdades da realidade dos alunos, das escolas públicas brasileiras. Como diz o educador português José Pacheco, formamos professores do século XX para trabalhar com alunos do século XXI. Quer dizer, há um grande distanciamento das teorias e das práticas pedagógicas.
Sendo assim, diante das adversidades e da falta de atratividade da carreira, já começamos a conviver com a falta de professores. Segundo dados do MEC, em seis anos, 40% dos professores do Ensino Médio já terão condições para se aposentar. Sem contar o adoecimento de parcela significativa de professores na atualidade, que trabalham em condições precárias nas escolas, que sofrem com a falta de estrutura, de materiais, sem contar com a baixa remuneração salarial. Além do mais, estão cada vez mais expostos a situações de indisciplina e violência.
Por outro lado, diante dessa conjuntura, não há muito interesse pela carreira do Magistério. Segundo pesquisa recente, do ano de 2011, da Fundação Carlos Chagas, apenas 2% dos jovens concluintes do Ensino Médio manifestou interesse em cursar Pedagogia ou alguma outra licenciatura, o que é preocupante, já que a meta 15 do Plano Nacional de Educação estabelece que, até 2024, todos os professores da educação básica tenham curso superior. Mas como garantir isso, se não temos sequer à previsão de formação do contingente mínimo de professores para atuar na educação básica em um futuro próximo?
O ponto da permanência na escola é outro fator importante. Se por um lado, alcançamos a universalização do ensino fundamental, já que mais de 98% dos alunos dessa etapa estão matriculados na escola, por outro lado, a evasão escolar ainda é muito alta, principalmente no Ensino Médio. Nessa etapa de ensino, levando em consideração a média nacional do ano de 2013, cerca de 60% da população em idade escolar (de 15 a 17 anos) estavam matriculados na escola. Além de ser um número baixo de matriculas, considerando o tamanho da população brasileira nessa faixa etária, dificulta a meta 3 do PNE, que estabelece que esse número chegue a 85% em 10 anos. Além do mais, não há garantias de que todos vão concluir essa etapa de escolarização. Muitos, por diversos motivos, acabam desistindo dos estudos.
A questão do Ensino Médio é estratégica à qualificação da educação do país. Isso porque ele é o caminho natural para as matrículas ao Ensino Superior. Nesse sentido, o ENEM foi uma importante politica pública de acesso as Universidades públicas, por meio do SISU, e das Universidades privadas, por meio do PROUNI e do FIES. No entanto, prevalece no Brasil à seletividade, a cultura do vestibular, que faz com que aqueles que têm melhores condições sociais e culturais tenham mais oportunidades. Desse modo, essas politicas afirmativas ainda são insuficientes para solucionar a exclusão da maioria dos jovens da escola pública ao Ensino Superior, visto que a maioria das vagas oferecidas é preenchida por alunos da rede particular de ensino.
Se não bastasse tudo isso, ainda enfrentamos uma das piores crises financeiras dos últimos anos. Desse modo, tem-se reduzido cada vez mais o orçamento de todos os governos, em todas as esferas, Federal, Estadual e Municipal. Com isso, houve muitos cortes de orçamento, inclusive do próprio Ministério da Educação.
Daí que vem a maior contradição: um país que tem como slogan “Pátria Educadora” não há tem como prioridade? Ou seja, diz que ela é importante nos discursos, mas na prática prevalece ainda uma visão economicista de gestão, de corte de gastos em detrimento da educação. Mas será que a educação é gasto?
Ora, quem não investe na educação do seu país não pode querer que ele mude. Se o Brasil realmente quiser sair da condição desfavorável em que se encontra e for um país que supere suas dificuldades e desigualdades, que seja referência em pesquisa e tecnologia, que seja protagonista nos Exames Internacionais de Avaliação, como o PISA, e não apenas coadjuvante, com desempenho abaixo de países de mesmo porte, dentre outros aspectos, deverá mudar os rumos de sua educação.

No mais, a educação é urgente e deve ser prioridade absoluta de qualquer governo, mas não só como propaganda, mas com politicas educacionais efetivas, de estratégia, investimentos e melhorias, a começar por cumprir todas as metas do Plano Nacional de Educação, investindo na educação básica, desde a pré-escola, em melhores condições de trabalho, na melhoria da remuneração dos professores dentre outras iniciativas porque investir em educação é investir no futuro do país, nas novas gerações que poderão ter enfim, o orgulho de ser uma “Pátria Educadora” de fato.

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