segunda-feira, 7 de dezembro de 2020

O que diz a Constituição Federal de 1988 sobre o dever do Estado e a Educação Infantil?

Foto 1: Ideia Pedagógica

Giovanna Maria Recco Piccirilli

    A educação infantil é reconhecida como a primeira etapa da educação básica. Quando a relacionamos ao neoliberalismo, observamos que tal concepção de Estado provém de uma ação descentralizadora, de transferência das ações de políticas sociais para a sociedade e pressupõe que a privatização dos serviços públicos seja a melhor alternativa. Ora, a escola é tão importante quanto o capital. É preciso lutar pela e para a escola pública, não para a escola capitalista e burguesa. Vemos alterações em leis e na Constituição, mas pergunto se o ordenamento jurídico estabelece suas funções e obrigações tão bem quanto estão descritas no papel. A CF/88 em sua primeira versão, excluía a educação às crianças menores de quatro anos, embora conste na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), em seu artigo 4º[1], inciso II, atendimento gratuito em creche e pré-escola para crianças de até cinco anos de idade.


    A modificação da criança abstrata para a criança concreta, ou seja, a criança da classe trabalhadora, nos recorda à pesquisa iconográfica sobre seu papel social abordado por Philippe Ariès na obra História Social da Criança e da Família (1978), que analisa o pequeno à imagem de um homem em miniatura (anões) e aborda que o papel de crianças negras pequenas, era o de trabalhar em casarões como brinquedos das crianças ricas, e as mais velhas, aprendiam o trabalho braçal (meninos eram treinados para a lavoura, e meninas para trabalhos do lar).


    Há recortes históricos que analisam toda linha do tempo que o pequeno jovem sofreu na sociedade. Observamos, consideravelmente, que ele passou a conceber seu papel social há pouco tempo, assim como as leis que garantem segurança e direitos a elas. 


  Esta reflexão nos remonta a um questionamento: porque existem tantas leis que asseguram e prometem vigorar tais premissas, tantas obrigações do Estado, mas pouca efetividade na execução das tarefas?

     A Constituição Federal de 1988, afirma no art. 208 que:

O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de:

I -  educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ela não tiveram acesso na idade própria;

II -  progressiva universalização do ensino médio gratuito;

III -  atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;

IV -  educação infantil, em creche e pré-escola, às crianças até 5 (cinco) anos de idade;

V -  acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI -  oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do educando;

VII -  atendimento ao educando, em todas as etapas da educação básica, por meio de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.

     Assim como em seus parágrafos:

§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo.

§ 2º O não-oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público, ou sua oferta irregular,

importa responsabilidade da autoridade competente.

§ 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela freqüência à escola.

 

     A responsabilidade por garantir e oferecer educação, que é um direito de todos, é compartilhada pelo Estado, pela família e por toda a sociedade. Cury (2008) afirma que a LDB, além de introduzir o conceito de “educação básica”, surge para assegurar ainda mais o acesso a esse direito – a educação escolar é pública, de caráter próprio e cidadã, ou seja, dever do Estado. Essa responsabilidade está determinada no artigo 205[2] da CF, acrescentando a sociedade como corresponsável por assegurar a garantia do que está estabelecido supracitado, no dever de se organizar de forma a ministrar o ensino com base nos princípios de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola.

 

Referências

ARIÈS, P. História social da infância e da família. Tradução: D. Flaksman. Rio de Janeiro: LCT, 1978.

BRASIL. Constituição da República Federal (1988). Acesso em 30 nov. 2020. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm>.

CURY, Carlos Roberto Jamil. A educação básica como direito. Cadernos de Pesquisa, v. 38, n. 134, p. 293-3030, maio/ago. 2008. Acesso em 30 nov. 2020. Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/cp/v38n134/a0238134.pdf> .

Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (1996, 23 de dezembro). Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Diário Oficial da Uniãoseção 1. Acesso em 30 de nov. de 2020. Disponível em: < http://www.cp2.g12.br/alunos/leis/lei_diretrizes_bases.htm>.

SILVA, Luiz Henrique Gomes da; STRANG, Bernadete de Lourdes Streisky. A obrigatoriedade da educação infantil e a escassez de vagas em creches e estabelecimentos similares. Pro-Posições, v.31, 2020. Acesso em 19 de nov. de 2020. Disponível em: < https://www.scielo.br/pdf/pp/v31/1980-6248-pp-31-e20160069.pdf>.



[1] Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:
II - progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio (BRASIL, 1996).

[2] Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

 

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