terça-feira, 18 de agosto de 2020

Resenha: "Quarto de Despejo - Diário de uma Favelada" de Carolina Maria de Jesus

Convite de Leitura e de Reflexão


LIVRO: QUARTO DE DESPEJO - DIÁRIO DE UMA FAVELADA 
ESCRITORA: CAROLINA MARIA DE JESUS 

Adriana Maria Silva
Ana Paula Silveira 

Quarto de despejo é um livro publicado em agosto de 1960, e a obra é a união de mais de 20 diários escrito por Carolina Maria de Jesus, mulher negra, guerreira, mãe solteira, moradora da favela Canindé, criou seus filhos com seu suor e sua força. 

Quarto de despejo é um livro que conta através das vivencias de Carolina, o que é a favela e principalmente como é morar lá. 

Em seus diários, Carolina, acha forças para discorrer como são seus dias de trabalho, recolhendo reciclagem na cidade de São Paulo, para chegar ao final do dia e tentar conseguir algo para dar de comer aos filhos. 

Esses diários foram escritos entre 15 de julho de 1955 e 1 de janeiro de 1960. Aqui Carolina nos revela uma mãe que mesmo esgotada, cansada de tudo, ainda encontra forças para seguir por seus filhos. 

“Saí indisposta, com vontade de deitar. Mas, o pobre não repousa. Não tem o previlegio de gosar descanço. Eu estava nervosa interiormente, ia maldizendo a sorte. Catei dois sacos de papel. Depois retornei, catei uns ferros, uma latas, e lenha.” 

Carolina, estudou até o segundo ano (primário), porém, muito autodidata conseguia nos transmitir um texto poético e cheio de sentimento (muito triste e real). 

"Tenho apenas dois anos de grupo escolar, mas procurei formar o meu carater" 

Lendo quarto de despejo, certamente muitos sentimentos vem à tona, um misto de tristeza, revolta, vontade de fazer algo para que toda aquela dura rotina não estivesse em cena. 

Carolina, chega a citar que a fome tem cor, e que seria amarela. Essas passagens são muito difíceis de ler. Muitas vezes ela busca por doações ou recolhe coisas do lixo. 

São cenas fortes que passa pela imaginação do leitor, muitas vezes chega a ser como soco no estomago. 

“A tontura do álcool nos impede de cantar. Mas a da fome nos faz tremer. Percebi que é horrível ter só ar dentro do estômago.” 

Enfim, um livro em que encontramos uma mulher batalhadora que além de passar fome, lutava, como uma leoa, para tentar dar que seja um pão aos filhos, para não os ver morrerem de fome. 

Temos aqui relato de sobrevivência, força, coragem, fé e muita luta. Luta contra a miséria, a fome e a falta de apoio que infelizmente muitas mulheres enfrentam sozinhas até os dias atuais. 

Devemos impedir o despejo dos nossos direitos fundamentais, devemos lutar contra o negacionismo que vivemos, lutar contra um governo que destrói, que nos despeja diariamente. Mulheres, pretos, homossexuais, crianças são despejadas, por meio de “comentários”, legislações e ações, o despejo não é só físico, ele é social, ele é cultural. 

A fome tem cor, a dor tem cor, o despejo também tem cor, essa cor pode ser representada por sentimentos na atual sociedade brasileira o “ódio” ganhou forças, se perfaz as cores, se alguém perguntar qual a cor da fome, qual a cor do negacionismo? Meu car@ todas as cores, mas se existe algo, além das cores, então posso dizer que o ódio... a cor universal do presente momento e talvez do que viveu a Carolina de Jesus. 

Frente a isso fica o convite para leitura dessa grande obra!

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Ser feminista ou ser "feminazi”?

 

Foto 1 – Feminismo – Imagem de Stoodi (jul, 2020).

Giovanna Maria Recco Piccirilli

Comparar duas linhas tão opostas de pensamentos como o feminismo e o nazismo é proveniente de alguém que não tenha o mínimo de cognição, interesse ou conhecimento.

Sabemos, historicamente falando, que o nazismo foi terrivelmente opressor e de desprezo à liberdade que serviu de intolerâncias a um universo desigual, apontando severamente seu "descontentamento" e práticas de ódio ao racismo, sexismo e misoginia, e de certa forma, idolatria ao machismo.

Na história da opressão, vemos que os líderes de tais grupos foram todos formados por homens - na Itália, Mussolini e Hitler, na Alemanha - nomes que ao serem citados nos causa pânico.

Vejamos: ser uma feminazi é ser um machista contemporâneo (o que não cabe ao termo feminismo, visto que seria o ódio de mulheres por mulheres.

Contraditório, se entender que o feminismo se trata de amor ao próximo, às lutas históricas, à liberdade e igualdade. Dois termos extremamente distintos que, inviavelmente tenham se associado e tornado o feminismo tão mal visto perante a sociedade moderna.

Até porque, além do regime nazista ter sido imensamente horroroso, se trata de uma comparação maldosa e irracional, pela qual compara-se o homicídio em massa com a luta por um ideal.

Enquanto o feminismo defende uma reestruturação social justa entre homens e mulheres, o nazismo segregou, humilhou, torturou e matou milhões dentro de um regime autoritário.

Portanto, torna-se claro que ambas realidades estão anos-luz de diferença uma da outra. Chamar alguém de feminazi é altamente ofensivo e desapropriado.
Então pare!  Deixe o mundo ser livre da opressão, deixe o diálogo ser livre de agressão, deixe as feministas lutarem por nossos direitos equânimes, sem termos caóticos e repugnantes.

Dê lugar a paz e não ao ódio, para assim seguirmos essa luta justa em busca de uma democracia real, perseverando até que toda repressão seja eliminada.

 


domingo, 16 de agosto de 2020

O fundo do poço

Foto 1 - Fundo do Poço - Imagem de freestocks-photos por Pixabay


Fábio Augusto da Silva Lima 


“Caímos dentro de um poço; temos que sair dele com sabedoria. ” - Provérbio Chinês

 

Em artigo publicado neste espaço, de 30 de abril de 2018, intitulado “A Democracia, o Voto e o exercício da Cidadania”, estávamos as vésperas das eleições presidenciais e naquele momento tinha expectativas de que pudéssemos mudar o quadro político, econômico e social do qual nos encontrávamos no Brasil.

Defendia, a época, que a consciência política era fundamental dentro do processo democrático, mas alertava que somente o voto não era suficiente, era também necessário a participação política em todo o processo eleitoral, desde a escolha de nossos representantes até o acompanhamento de todo o seu trabalho parlamentar, pois como defendia o sociólogo brasileiro Herbert de Sousa: “Ou a Democracia é para todos ou então não serve para nada”.

Além disso, escrevi que a mudança era possível e necessária, mas somente com a participação popular e cidadã, pois fora da democracia, só nos restaria o autoritarismo e a barbárie. Nesse caso, prevaleceu minha previsão mais pessimista.

Ora, depois de mais de dois anos desse artigo, com o Governo Bolsonaro eleito e no poder, além de todo o retrocesso vivido pelos brasileiros nesse período, com o aumento do desemprego, da pobreza e da miséria, inclusive com uma Pandemia, que assola o país desde 26 de fevereiro desse ano, no surgimento do primeiro caso, a palavra que fica é de perplexidade, diante da postura do presidente, desde a chegada do vírus por aqui.

O Brasil já perdeu mais de 100.000 pessoas, vítimas do Coronavírus, e o Governo de Jair Bolsonaro não é capaz de lamentar por essas vidas perdidas.

Nenhum dia de luto nacional. Nenhuma palavra de consolo e solidariedade com os mortos. Estamos diante de alguém que não tem empatia ou solidariedade pelos que se foram.

E não são apenas números ou estatísticas. São mais de 100.000 famílias de luto. É muita dor, são muitas lágrimas, cada óbito é uma história de vida e de amor.

Também não se tratou de uma fatalidade, foi uma tragédia anunciada, uma vez que o principal líder político da nação chegou a negar a pandemia e boicotou as medidas de prevenção pedidas pela ciência e a medicina.

Ao mesmo tempo, travou uma guerra permanente com governadores e prefeitos, que ganharam do STF uma liminar que lhes garantia autonomia para estabelecer políticas que consideravam mais adequadas no combate ao Coronavírus, incentivando a população a não cumprir as medidas de isolamento e distanciamento social.

Se não bastasse tudo isso, ainda humilhou seus ex-ministros de Saúde, forçando a saída de todos que estiveram no cargo, tudo porque não corroboravam de suas convicções, tendo agora um general da reserva do exército na pasta.

Ainda teve o sarcasmo de dizer que “todos temos que morrer”. Sim, todos vamos morrer um dia, mas muitas dessas pessoas podiam ter se salvado com um mínimo de cuidado e interesse pela vida humana.

As famílias das vítimas não tiveram nem mesmo a oportunidade de velar e enterrar seus entes queridos como gostariam. Foi dor somada a dor. Muitos foram enterrados na calada da noite, em valas comuns.

O silêncio cínico de um governo, com coração de pedra, aumenta ainda mais a dor das famílias enlutadas.

Vivemos num país, cujo as autoridades são incapazes de sentir responsabilidade e menos ainda empatia e dor com as vítimas de uma tragédia, ou seja, estamos chegando ao fundo do poço.

E a tragédia do Coronavírus no Brasil não acabou e ainda pode ceifar muitas vidas. Ao que tudo indica, infelizmente ainda teremos muitas vítimas da Covid-19.

E assim como as autoridades da nação revelaram um coração endurecido com as vítimas, o mesmo fazem com relação aos médicos e enfermeiros que estão na linha de frente e sacrificam suas vidas para salvar inúmeras outras nos sistemas de saúde público e privado. Em alguns casos, foram até ofendidos e agredidos pelos negacionistas e extremistas de plantão.

Se há alguma esperança, em todo esse contexto, é que o Governo Bolsonaro foi denunciado recentemente por entidades medicas do mundo todo ao Tribunal Internacional de Haia, por omissão e crimes contra a humanidade, mais especificamente, contra as comunidades indígenas do pais. 

Nesse sentido, na atual conjuntura mundial, O Brasil é, conforme relatos vindos de fora, o país que mais desprezou a Pandemia, que menos valorizou a Ciência e que mais desinformou sua população.

É fato que o Brasil precisaria ter, neste momento, um presidente capaz de detectar a dor das pessoas, mas um governo cujo vocabulário, quando não soez, está sempre carregado de negatividade (guerra, armas, ódio, inimigos, enfrentamento e ameaças) e nunca de palavras que favoreçam a convivência pacífica (paz, liberdade, diálogo, solidariedade e compaixão).

Para o azar dos brasileiros, temos no poder, nas palavras do espanhol Luís Buñuel, o “Anjo Exterminador”.

Portanto, se essa for a nossa condição, de fundo do poço, que ao menos possamos aprender com essa tragédia, enfim, que esse possa ser para os brasileiros um momento pedagógico, de aprendizagem, para que possamos aprender que o voto é algo muito sério, que a democracia de um país vale muito mais do que um projeto narcisista e autoritário de poder, como também possamos sair desse poço melhores, com sabedoria, mais conscientes e esclarecidos politicamente.

domingo, 2 de agosto de 2020

Interpretação Hermenêutica dos Direitos Humanos

Fotografia 1 - Fonte: Brasil Escola-UOL

Vinício Carrilho Martinez.

• Considerando-se que não sabemos diferenciar um Estado de um Governo, desconsiderando-se a Constituição em sua forma político-jurídica, que não se sabe diferenciar Direito de lei, e as críticas de “falibidade constitucional” são, em verdade, críticas da Realpolitik.

• Considerando-se que se confunde análise epistemológica e nomológica (constitucional) com críticas à forma-Estado, sendo que nem se trata do Estado de Direito Democrático.

• Considerando-se que o Poder Político atual é o antípoda da CF88, e jamais seu prolongamento.

• Considerando-se que não se pode criticar um objeto pelo lado de fora, sem conhecer de fato sua essência, a crítica apressada se limita a um empiriocriticismo.

Consideramos essencial conhecer a Constituição Federal de 1988, a forma-Estado ali definida como Estado de Direito Democrático – e que é o oposto do praticado a partir, pelo menos, de 2016 – e seu corolário de liberdades, direitos e garantias, a fim de que se mergulhe no Objeto Constitucional (real) e não se propague ainda mais o empiriocriticismo.

Consideramos fundamental rechaçar a crítica baseada na superfície de um “objeto esvoaçante”, em que se falseia (ideologicamente) uma crítica constitucional, como se a própria CF88 houvesse criado a opressão capitalista e o Fascismo Nacional.

Consideramos que se desconhece a História Constitucional que sustenta a CF88 e sua própria herança político-constitucional, que remonta à Constituição Espanhola e Portuguesa, além da Revolução dos Cravos e da luta espanhola contra o franquismo.

Consideramos que se apresse uma suposta crítica marxista, em que a forma-Estado capitalista – sempre opressiva – não seria diferenciada tanto no Estado de Direito Democrático quanto sob o Fascismo Nacional. Entretanto, não é isso que se verá nesta análise, especificamente porque não é desse modo que a realidade se apresenta e nos bastaria consultar alguns anos de história política.

Ao que, ainda se acrescenta, não se tratar de uma crítica política que se sustente em qualquer aprofundamento de Hermenêutica Constitucional. Aliás, neste ponto, alinham-se as críticas de uma parcela da esquerda (reducionista) e da direita ou extrema direita (sectárias). Em suma, confunde-se forma-Estado capitalista, sob o Fascismo Nacional, e se ataca a Constituição não em seu objeto, mas sim construindo-se uma “crítica fora do lugar” – de tempo e espaço – e em torno de um suposto “objeto esvoaçante”.

Desafia-se, assim, quem possa demonstrar que a Carta Política de 1988 guarda em si os germes da opressão, da autocracia e da repressão fascista, salvo a péssima escrita do art. 142: e mesmo este deve ser lido de acordo com o Princípio da Unidade Constitucional. Isto é, um artigo mal escrito – com brechas autoritárias de tomada de poder – não autoriza a desconsideração constitucional no seu cerne e Objeto Constitucional: desconcentração e descentralização do poder, autonomia, emancipação, participação, reconhecimento dos Direitos Humanos Fundamentais, do Princípios da Dignidade Humana e do Princípio da Corresponsabilidade Social.

A CF88 alinha-se ao Processo Civilizatório. Não se atentar a isto, é sinônimo de desconhecimento em leitura preliminar da Carta Política.

sábado, 1 de agosto de 2020

Carta aberta à democracia

Fotografia 1 - Fonte: Linton Publio/Seeb-SP (2018)


Giovanna Piccirilli

Olá, Democracia, vulgo "o poder emana do povo" ou também conhecida como Rainha Soberana, Princesa Libertária e Imperatriz Suprema. É curioso ver um substantivo feminino usado hoje. Na verdade, é importante que a senhora seja o feminino (até porque percebemos ao longo da história a luta das mulheres acerca de direitos e igualdades e o quanto são fortes e resistentes). Aliás, "resistir" é uma palavra muito dita, mas pouco sentida.

Querida Democracia, estou um tanto preocupada com os acontecimentos, veja, sinto que a senhora está fragilizada e debilitada... Antes fosse por doença!

Mas a doença que vejo é o golpe fascista e totalitário, comandado por um vírus ditador. Acredito ser um atestado de morte, um óbito prematuro talvez. Mas há cura, há solução - a vacina da igualdade e liberdade.

Compreendo que essa liberdade de manifestação seja vossa assinatura, mas existem questões perigosas que estão querendo te atingir diretamente e levar à óbito. A senhora ainda não percebeu? Alguns querem que desapareça e que junto, vá todo nosso arsenal de histórias, lutas e conquistas que se remontaram por todos estes anos. Então, minha cara, tenho um alerta: estamos precisando da sua voz e não do seu choro. "O gigante acordou" de fato e não é balela ou balbúrdia, é essencial no momento. Sei que não está entendendo muito bem essa doença que te entristece e fere sua alma, que ameaça e te enfraquece. Mas sabe Democracia, eu compartilho do mesmo sentimento e tenho lutado para não me contaminar também, tenho lutado contra discursos disfarçados em ódio, contra todo negacionismo da história e da ciência, contra todo ato racista e fascista. Sei que não entende muito essa situação de ameaças, mas só a senhora consegue liderar e deter esse colapso político e social que se aproxima. Apenas a senhora.

Não estamos no carnaval, mas a senhora pode sambar na opressão e será aplaudida. Não seja tímida, seja voraz como está sendo desde 1988.

É um ato heroico e libertário, acredite em mim, poucos conseguem levantar essa bandeira.

Aguardo vossa perfeita manifestação como esta nação merece e não precisa chorar mais, Dona Democracia. A senhora está sendo ouvida e estamos aguardando seu sinal para aplaudi-la e exaltá-la como merece. Essa doença vai passar! Seus apoiadores são maioria, acredite em mim, jamais a deixaremos sozinha nesta luta. A senhora é a única capaz neste momento. O palco é seu e a luta é nossa!